Regulamentado no Brasil pela Lei 12.683 de 2012, o crime de lavagem de dinheiro consiste na “dissimulação e ocultação da origem de recursos provenientes de qualquer crime ou contravenção penal”. Na prática, “lavar dinheiro” nada mais é do que fazer circular, de forma aparentemente legal, bens e valores procedentes de ações ilegais. De acordo com o Ministério da Economia, para disfarçar lucros ilícitos sem comprometer os envolvidos, a lavagem de dinheiro ocorre em três etapas: o distanciamento dos recursos de sua origem, evitando uma associação direta com o crime; o disfarce das movimentações dos valores para dificultar o seu rastreamento; e o retorno do dinheiro “limpo”. Neste processo, ao buscar a aparência de legalidade, os criminosos se valem de inúmeros serviços – como o dos tabelionatos de notas.
Ao ser o agente delegado pelo Estado para formalizar atos e garantir a segurança jurídica, o tabelião realiza e dá fé pública a operações de todo o tipo. No dia a dia da atividade notarial, porém, não raro ele identifica indícios de fraude e de atos ilícitos. É por esse motivo que é tão relevante o Provimento 88/2019 publicado no dia 1° de outubro pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): ele insere os notários e registradores brasileiros nos esforços de combate à corrupção, à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. A partir de 3 de fevereiro de 2020, quando a normativa entrar em vigor, todos os tabelionatos brasileiros terão que informar operações suspeitas à Unidade de Inteligência Financeira (UIF, o antigo Coaf). “O notariado passará a exercer um papel crucial na identificação de crimes como a lavagem de dinheiro, abastecendo as autoridades com informações sobre atos suspeitos e operações potencialmente ilícitas”, explica o presidente do Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF), Paulo Roberto Gaiger Ferreira. Aliás, neste 29 de outubro, é celebrado, em todo o País, o Dia Nacional de Prevenção à Lavagem de Dinheiro.
Desde que assumiu o comando da entidade representativa dos cerca de oito mil tabeliães do Brasil, em 2016, Gaiger fez da inclusão do notariado nos esforços anticorrupção uma de suas principais pautas. Agora, às vésperas de encerrar o seu triênio à frente do Conselho Federal, o tabelião comemora o resultado obtido. “Foi um árduo trabalho desenvolvido em conjunto com o CNJ, com outras entidades representativas e com integrantes da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA). Essa normativa aproxima o tabelião da sociedade, reforçando a sua missão de servir ao cidadão”, argumenta Gaiger.
Comissão dedicada ao tema
Coube ao vice-presidente do CNB/CF e coordenador da Comissão de Combate à Lavagem de Dinheiro e Corrupção da entidade, Filipe Andrade Melo, representar os tabeliães no processo de construção do Provimento 88/2019. Ao longo dos últimos anos, ele participou ativamente dos debates em torno da normativa que, ao ser assinada, cumpriu uma das metas estabelecidas pela ENCCLA para serem executadas em 2019. “O provimento 88 atende à ação de número 12, que previa a inclusão dos notários e registradores no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Ele é um marco após muitos anos de trabalho na busca por essa regulamentação”, destaca.
Com a normativa, segundo o vice-presidente do CNB/CF, em um curto espaço de tempo, os notários podem se tornar referência não apenas em relação ao volume de informações prestadas às autoridades, mas, principalmente, no que se refere à qualidade dos dados informados e à sua relevância para as investigações de casos de corrupção. “Foi o que aconteceu em países como a Espanha, onde o notariado é, hoje, o segundo ente regulado com mais informações prestadas ao governo, atrás apenas das instituições financeira. É isso que esperamos daqui para frente no Brasil”, afirma.