A Câmara Federal aprovou recentemente projeto de lei que tipifica e estabelece punições para os chamados abusos de autoridade. A proposta gerou polêmica, considerada por alguns segmentos da sociedade como uma tentativa de inibir o combate à corrupção no país.
Carlos Eduardo Rodrigues Bandeira, advogado especialista em direito penal explica que o Projeto de Lei 7.596/17 possui a finalidade de estabelecer uma nova sistemática para disciplinar todos os atos que ultrapassem a normalidade legal e constitucional das funções exercidas por agentes públicos.
“Na nova lei, qualquer agente público, independente da função ou se temporário, poderá responder por abuso de autoridade”, afirma. As punições vão desde a perda da função pública, inabilitação para exercer cargo público de um a cinco anos, pagamento de penalidade e pena de reclusão.
O objetivo desse projeto é proteger o cidadão contra eventuais abusos que venham a ameaçar a integridade física, a liberdade ou qualquer outra garantia constitucionalmente protegida. “Na verdade, é uma tentativa de atualização da Lei 4.898/65 assinada pelo então presidente General Castello Branco que vigorou praticamente durante toda a era militar e os primeiros 30 anos da nova ordem constitucional”, lembra o especialista.
São considerados atos de abuso de autoridade todos aqueles previstos nos artigos 3° e 4°, como o atentado à liberdade de locomoção, a inviolabilidade do domicílio, ordenar ou executar pena de prisão sem observar o devido processo legal e submeter uma pessoa em custódia do estado à situação vergonhosa, por exemplo.
O abuso de autoridade e a ameaça de combate a corrupção
Segundo Bandeira, a nova lei só ameaçaria o combate à corrupção se alterasse outros mecanismos legais e processuais para a cruzada institucional brasileira de combate ao crime. Seria ameaça por exemplo extinguir crimes como organização criminosa, crimes relacionados com a lavagem de capitais, como a evasão de divisas e os próprios crimes de particulares e servidores públicos contra a Administração pública.
“O que a nova lei deseja fazer é estabelecer um balizamento entre as condutas de funcionários públicos e o modelo de garantias constitucionais e legal-processuais brasileiras”, aponta o advogado. Contudo, a nova lei traz o caso de novatio legis in pejus, ou seja, ela atribui uma penalidade maior do que a lei anterior. “Assim o legislador adquire uma postura mais punitiva em relação aos casos de abuso de autoridade”, diz.
O que muda para investigadores e juízes
Aqueles que detêm os poderes de investigação e julgamento só podem ser punidos se extrapolarem no uso desses poderes, utilizarem esses poderes com outra finalidade que não seja a realização da justiça penal.
“A lei visa responsabilizar condutas atentatórias às garantias constitucionais e processuais dos cidadãos, mas não altera as demais leis que tipificam crimes relacionados à corrupção ou qualquer outra espécie de crime e que trazem as competências das forças policiais e da magistratura”, afirma o advogado.
A punição para esses agentes públicos deve respeitar o devido processo legal e o contraditório. “Todas as garantias processuais estão mantidas, não houve retrocessos nesses direitos”, destaca Carlos Eduardo Rodrigues Bandeira.
A lei de abuso de autoridade como ferramenta de retaliação
Para Carlos Eduardo Rodrigues Bandeira, a lei do abuso de autoridade é como qualquer outra lei do sistema brasileiro, está sujeita a interpretações, assim como a eventuais distorções na sua aplicação. “O problema da retaliação ocorre justamente na distorção da aplicação de uma lei”, explica o especialista.
“O que não deve ocorrer, em hipótese alguma, é a criminalização de instituições e suas funções constitucionais pela utilização distorcida de uma lei, já que essas instituições fazem parte do alicerce do estado democrático e de direito”, conclui.
Sobre o advogado
Carlos Eduardo Rodrigues Bande