27/07/2018 às 10h30min - Atualizada em 27/07/2018 às 10h30min

A algoz de Lula

Quem é Carolina Lebbos, a caçula dos juízes criminais de Curitiba, que cuida com mão de ferro das condições em que o ex-presidente cumpre sua pena de prisão

Quando um processo de execução penal cai nas mãos da juíza substituta da 12ª Vara Federal de Curitiba, Carolina Moura Lebbos, os advogados costumam concluir que aquele não era seu dia. A mais nova magistrada entre os juízes criminais do tribunal — ela tem 35 anos —, Carolina é conhecida por ser afável no trato pessoal, mas severa e inflexível quando está empunhando caneta.

Em fevereiro, o titular da Vara, Danilo Pereira Júnior, foi convocado para substituir um desembargador, e Carolina ficou encarregada de todos os processos sob sua responsabilidade — incluindo o do ex-presidente Lula, condenado a doze anos de prisão no caso do tríplex no Guarujá. É ela que tem impedido o petista e seu partido de transformar a cela num palanque político.

A mão de ferro para com o ex-presidente e seu partido teve momentos de drama e, também, de pastelão. Dezesseis dias depois da prisão do petista, a juíza negou o pedido do PT para que uma comitiva de deputados fosse conferir as condições em que se encontrava o ex-presidente.

Afirmou que senadores já haviam ido ao local alegando o mesmo objetivo e que não havia nenhuma informação de violação de direitos humanos no local. Em reação, o deputado Wadih Damous chamou Carolina de “juizeca fascista” e apoiadores de Lula passaram a encaminhar-lhe seguidas solicitações de visita que sabiam impossíveis. Elas chegaram a quase uma centena e incluíram até a de um sanfoneiro de Pernambuco que apresentava como justificativa sua admiração incondicional pelo petista.

Quando, em 25 de abril, Carolina negou o pedido para que Lula fosse atendido, “em caráter de urgência”, por dois médicos, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, disse no Senado que “negar assistência a Lula é crime contra a humanidade”. Alguns dias depois, diante da justificativa da defesa de que Lula deveria ser acompanhado para tratar a hipertensão, a juíza voltou atrás e permitiu que os médicos pudessem entrar sempre que fossem solicitados.

 

O ex-presidente, no dia de sua prisão: “Ela não me deixa fazer nada”
(Heuler Andrey/AFP)

Quem conhece a magistrada não estranhou seu comportamento. Em fevereiro do ano passado, Carolina negou o pedido para livrar da cadeia uma mãe de duas filhas condenada em segunda instância a treze anos de prisão por peculato e lavagem de dinheiro. A mulher, uma empresária de Curitiba, ainda amamentava sua caçula, de 8 meses, quando a Justiça determinou a execução de sua pena. A defesa usou a amamentação para pleitear o regime domiciliar para ela. A juíza não amoleceu. Decidiu que a empresária poderia amamentar no presídio e que, por ser casada, não era a única responsável pelas crianças.

Entre os presos da Lava-Jato, Lula não foi o único a penar nas mãos da magistrada. Em outubro de 2016, o empresário e delator Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, que estava no regime aberto, pediu autorização para uma viagem de sete dias ao exterior com o “objetivo de prospectar negócios” para o Brasil. O Ministério Público Federal não se opôs à viagem, mas a juíza sim. Ela escreveu que, apesar de ser um colaborador da Justiça, Mendonça Neto estava cumprindo pena e tinha de arcar com as “limitações decorrentes de tal cumprimento”. A doleira Nelma Kodama foi, da turma da Lava-Jato, quem teve mais pedidos rejeitados por Carolina.

 

Augusto Ribeiro de Mendonça Neto

A ex-aman­te de Alberto Youssef solicitou permissão para frequentar uma igreja evangélica, onde “distribuiria alimentos, roupas e brinquedos a moradores de rua e pessoas necessitadas” no horário em que não lhe era permitido ficar fora de casa, pois Nelma cumpre prisão em regime aberto.
 

Nelma Kodama

“Não”, foi a resposta da juíza, que ainda passou um pito na doleira, que seria dada a fazer “pedidos impertinentes e despidos de comprovação documental”. “Por menor que seja, todo pedido à juíza deve ser minuciosamente detalhado. Senão, ela não aceita”, diz a advogada Alessi Brandão, que já defendeu Nelma e hoje trabalha para Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana. Em janeiro, para poder ir ao velório do pai, Mônica precisou descrever passo a passo no Google Maps o trajeto que faria de sua casa ao enterro, especificando, inclusive, a quilometragem.
 

 Mônica Moura

Até hoje, a decisão mais controversa de Carolina Lebbos foi proibir Lula de dar entrevistas. A lei garante ao preso o direito de contato com o mundo exterior, mas não especifica se isso inclui falar com a imprensa. Nos últimos anos, presos famosos como Fernandinho Beira-Mar, Marcinho VP, Suzane von Richt­hofen e Paulo Maluf foram autorizados a conceder entrevistas. A negativa da juíza aos pedidos de Lula deu munição ao discurso do PT de que o ex-presidente estaria submetido a condições análogas às de um preso político — e censurado.

Apesar de linha-dura, a juíza é descrita pelos servidores da Justiça Federal como uma pessoa delicada e bem-hu­morada. Um deles atesta que Carolina não cumprimenta os funcionários por obrigação, mas que efetivamente se interessa em saber como estão, o que não ocorre com muitos outros magistrados. Os advogados de réus da Lava-Jato dizem que ela não costuma criar impedimentos para recebê-los e ouve atentamente seus argumentos, mas se queixam de que seus pedidos quase nunca são aceitos.

Com o processo de Lula em suas mãos, o prestígio da magistrada cresceu entre os colegas. Na quarta-feira 18, o presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Thompson Flores, fez uma visita ao tribunal de Curitiba só para conhecê-la. O encontro durou alguns minutos, durante os quais Flores fez questão de ser fotografado ao lado dela.

 

Thompson Flores e Carolina Lebbos

Carolina nasceu em uma família abastada de médicos de ascendência libanesa. Formou-se em direito na Universidade Federal do Paraná, em 2005, e estagiou num escritório de advocacia e no Ministério Público Federal antes de passar no concurso para juíza, em 2011. Ao ser nomeada, trabalhou no tribunal de Mafra (SC) e depois em Ponta Grossa (PR), até ir para Curitiba, em 2015.

Reservada, não está nas redes sociais e poucos colegas de trabalho têm conhecimento de detalhes de sua vida pessoal. Desconhecem seus assuntos de interesse, nem sabem se é casada. Sim, Carolina é casada com um juiz, só que da Corregedoria-Geral da Justiça, filho de uma desembargadora. Suas tentativas de manter-se longe dos holofotes estão começando a se tornar vãs em razão de seu freguês mais notório.

Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo recentemente, cujo título (“Afaste de mim este cale-se”) fazia referência à negativa da magistrada de permitir que desse entrevistas, Lula citou Carolina nominalmente: “Parece que não bastou me prender, querem me calar”.

A uma pessoa que o visitou na carceragem no último mês, o ex-presi­dente foi mais direto: “Essa juíza não me deixa fazer nada”. Tudo indica que Lula não terá dificuldades de livrar-se dela. Como a lei garante ao preso o direito de cumprir pena no estado onde mora, o petista pode pedir transferência para São Paulo. Assim, sairá automaticamente das mãos de Carolina. Mas, enquanto isso não for feito, a caneta dura de Carolina Lebbos continuará ditando o destino de Lula.

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